segunda-feira, julho 19

"Eu acredito em fadas"

Você já viu um adolescente apaixonado?
Não, não chega a ser um tipo raro de ser vivo. Na verdade, poderia ser descrito como uma variação da patologia normal da adolescência defendida por Knobel (para psicanalistas sempre é uma questão de patologia, o que é absolutamente normal, mas isso é outra conversa).

Paixão é...
- do Lat. passione, sofrimento;
- do Grego, pathos, que também significa excesso, catástrofe, passagem, passividade, sofrimento e assujeitamento;
- sentimento excessivo;
- amor ardente;
- afeto violento;
- entusiasmo;
- cólera;
- grande mágoa;
- vício dominador;
- alucinação;- sofrimento intenso e prolongado;- parcialidade.


É ele quem diz...Mas não é de se estranhar que facilmente observemos algo de loucura, de insano, patológico mesmo na paixão. Do adolescente então, nem se fala. O problema é quando pensam que há algo de anormal nisso tudo.
Quando se é adolescente, anormal é se assim não fosse...

A questão é: você já viu um garoto ou garota sem estar apaixonado? Eles estão SEMPRE intensamente ligados em algo. Naquela beleza de mulher, cujos mistérios os garotos não resistem (já dizia aquela música), conseguem tudo deles com um simples sorriso e lhes dão o mundo quando lhes dão um beijo. Só um beijo. Que, convenhamos, nunca será "só" um beijo. Pode ser de amor, de amizade, de carinho, afeição, ternunra, desejo, alívio, adeus...
Podem estar ligados naquela canção - o que é velho demais para eles; melhor seria naquela música, hit ou "parada". Sempre tem aquela que SIMPLESMENTE "amam de paixão" ou adoooooram! O fato é que sempre tem uma outra que amam ainda mais ou que amam mais do que você é capaz. É assm porque, quando estão em grupo, o "medidor da paixão"  é o que garante aquele ar de disputa amistosa, mas típica: quem é o mais ensandecido? Quem canta com mais paixão? Quem sabe todas as letras de cor? E a tradução delas? Quem se sente mais "traduzido" naquela música? Imagine as faíscas que saem quando um deles encontra outro na mesma condição. É um contágio só.  Os abraços mais apertados, os "ooiiii"'s mais rasgados, o andar saltitante ou arrastado, sempre dando um jeito de tocar no boné, no iPod, celular, fones de ouvido... Tudo pretexto para deixar encostar uma mão na outra, um braço no ombro do outro e por aí vai. Quem assite a cena se denrolando pela primeira vez, não tem como deixar de sorrir e sentir como se a primavera chegasse (ok, no Ceará não entendemos o que é isso, mas nada que nossa imaginação não seja capaz...).

Não é difícil de acontecer. Um refrão cantarolado e pronto. Amam-se totalmente, daquele amor que todo adolescente proclama aos quatro ventos. É um amor bem particular e que só eles sentem, porque entender mesmo ninguém entende, nem eles! Um ou outro mais metido a filosofias vai tentar explicar. Mas de um jeito absolutamente fugaz, o que é bem próprio deles. Ser intenso e sem energia, fugaz e eterno, absoluto e nulo, vibrante e entendiante, a lista é imensa! Mas no meio de todas essas polaridades, consegue perceber a paixão?
Diria que suas mentes funcionariam na base  do "Tudo só é bom porque é demais!". Porque se voltarmos à definição do termo, é assim que eles são, uns loucos-excessivos-sofredores-alucinados! Isto é, apaixonados... Por si mesmos, por outros, por vários, por todos ou por nenhum, por aquela música e por todas as outras, aquela banda, aquele ritmo, aquele cantor ou ator, por aquele time, pela Copa, por Carnaval ou CearáMusic, por aquele estilo, aquela roupa, por maquiagem, computador, chocolate, pizza, ou coca-cola, chiclete, ruffles, cinema, video-game, por aquele estilo de vida ou jeito de ser, por alegria ou sofrimento, por competição, conquistas, por ganhar, descobrir, por uma situação engraçada ou triste, por símbolos, figurinhas, tatuagens, animes, por ideais e ideologias, por seriados, por dançar até cair...

É impressionante como, para quem não chegou a ser (perguntem às crianças) ou já foi  (perguntem aos ditos adultos), um adolescente parece de outro planeta. O mais interessante é que quando se é um deles vez por outra você se sente exatamente assim. Como um ET, "só no meio da multidão". Mesmo dentro da sua "tribo" ou turma ou galera. Parecem cópias uns dos outros, mas mal-feitas porque sempre têm algo de particular. Talvez por isso busquem as duas coisas: o semelhante e o que é único. É a tal busca pela identidade de que todo piscólogo , escritor, educador já falou. Mas apesar de ser um processo comum, a jornada é individual.

Observe um deles num shopping, numa calçada com um ou outro de sua "espécie". Incrível como nos fazem pensar em que tempo maravilhosamente insano, fantástico e confuso todos passamos. Uns definem como tempo, fase, época, passagem... Continuo a imaginar como um parque de diversões, porque no meu parque teria todas aquelas polaridades mencionadas. Do amor ao medo, da adrenalina ao tédio. Mesmo que possamos reencontrar isso, recordar o passeio ao conviver com um deles, sempre nos lembram que o passeio acabou. E só tínhamois um ingresso.

Essa memória é positiva, por outro lado, quando nos faz ver em cada um deles um pouco de Pan, o deus das florestas, campos e rebanhos. Mas não porque não querem crescer, como nos mostra a figura de Peter Pan (Nem diga isso! Mesmo sabendo que tem sua verdade...), mas sim porque todos tem aquele olhar... Aquele olhar de gula, de querer devorar o mundo ou algo mais específico dentro dele. Sempre têm algo mais forte do que eles dentro de si. O próprio caos, será?

No fim, alguém dirá que estou fantasiando um mundo com esses adolescentes-ET's que criei, como se não existissem a miséria, o abandono dos pais, as drogas, a prostituição, a violência física, os assassinatos, a perseguição, a traição, a bagunça, a irresponsabilidade, a rejeição, o engodo, a dependência, o medo, a deficiência, a escuridão... Mas é claro que tudo isso existe e faz parte de suas vidas, interferindo na sua maneira de ser-estar no mundo. A diferença é que essa é a marca que muitos preferiram guardar deles.

Enquanto isso, podem pensar: "Mas ela descreveu como se fosse um conto-de-fadas!".
Continuo a ver os jovens (como se eu fosse uma ansiã! mas quem sabe...), os "garotos" como gosto de chamar, como aqueles que, acima de tudo, querem amar o mundo, salvá-lo para se amarem por isso. A verdade é que bem que poderia ser um conto-de-fadas mesmo, se terminássemos de contar a história na parte do "felizes para sempre".
Mas quando se tem o "para sempre" diante de si, quem vai querer parar ali?
Como disse Peter Pan, "viver será uma grande aventura".
Ou você não acredita em fadas? =)


quinta-feira, julho 8

Onde estarão meus brinquedos?

O filme Toy Store 3 é uma animação feita para voltar ao nosso tempo de criança. Saí do cinema pensando: "Será que todo mundo sai imaginando onde estão seus brinquedos velhos?". As crianças devem sair minimamente com medo de "cuidar mal" de um desses pertences e depois eles se voltarem contra elas; é o "arquétipo do brinquedo assassino". Mas como toda história tem suas polaridades, também devem sair deslumbradas com a possibilidade de seus brinquedos preferidos ganharem vida enquanto dormem, ou quando não estão olhando. Mal lembram os adultos que eles sempre ganham vida quando as crianças brincam com eles. Mas, para elas, parecem que têm uma vida própria.

Conheci uma garotinha de boa imaginação. Sempre tinha dessas de imaginar queos brinquedos eram serezinhos fantásticos, dotados de personalidade, de sonhos, medos e cheios de artimanhas, mesmo quando estavam guardadinhos nas prateleiras. Ganhavam ainda mais vida, logicamente, na hora da brincadeira. Afinal, essa é a razão de ser de todo brinquendo. E é isso que podemos ver em Toy Store 3...

Mas não quero me alongar nessa parte por enquanto. Agora, lembro que a garotinha cresceu e, num ato meio pensado, meio desesperado, desfez-se de praticamente todas as suas preciosidades. Aquelas desculpas de "Não uso mais isso", "Dê pra alguém que vá usar", "Quero o espaço para outras coisas"... E assim se foram todos os seus brinquedos.

Um ou outro devem estar num cantinho empoeirado da parte superior do guarda-roupa. Intocáveis. Esquecidos. Mas ainda cercados por um pouquinho daquele toque mágico de alguns anos atrás. Seria interessante revê-los...
E por que não?

 ATARI - O video-game mais legal que já teve, principalmente porque era daqueles que os pais conseguiam entender e brincar junto. Imagine a diversão de horas seguidas, quando se juntavam primos, mãe, pai, todos a disputar uma corrida, pegar os tesouros do fundo do mar, comer e fugir com o Pac-man, vulgo Come-come! É, vídeo-games podem ser um elo socioalizador de vez em quando. E pensam que o Wii é novidade...



Qual a criança que não era louca para fazer as mil peripécias com um ou dois ou três ou vários BAMBOLÊS? Em geral tinham uma fitinha enrolando todo o círculo e uma areiazinha dentro que fazia um baraulhinho que dava o charme final. Precisava de muito treino, agilidade para trocar de posição, queimava umas calorias... Só era preciso cuidado porque não era raro escapar uma vez ou outra e sair voando para bater em alguém desprevenido ou naquele vaso de plantas da sua mãe.


Dentro de nós todos temos um espírito de construtor. Parece uma coisa boba a ser deita, assim como esses bloquinhos também pareceriam entediantes. Mas não quando se é criança. Brincar de construir, desconstruir, derrubar, montar de novo, tentar fazer a torre mais alta do mundo, a vilinha mais colorida, o forte mais resistente... Um mundo de possibilidades para algus pedaçinhos de madeira.
Eis o poder da imaginação.



E a mesma coisa serve para os bichos da FAZENDINHA, da Gulliver. Qual a complexidade? Vejamos... Uma criança de hoje diria: o que eles fazem? E uma daquele tempo, ou mesmo uma de hoje na qual tenha sifo preservada viver a infância com todos os seus direitos, diria: Ah, muitas coisas. A vaca muge e adora pastar. E tem o bezerro que é seu filhinho. O cavalo galopa daqui para acolá. E tem os casais: a vaca e o boi; o bode e a cabra; o cavalo e a égua. Estão numa fazenda enorme, verdinha. O cavalo é o líder e protertor de todos. Um dia, apareceram uns lobos que queriam ultrapassar a cerca... Quer dizer, "os brinquedos fazem aquilo que a gente quiser".


Ah, mas quse sempre os bichos precisavam de uma mãozinha para se defenderem. então, surgiam os SOLDADOS DA 7ª CAVALARIA! Ou então, uma guerra começava entre homens e animais, natureza e civilização. Era um combate necessário em toda fantasia, pois fazia parte de todo o crescimento que estava a se desenrolar.


A MOLA MALUCA e o FLUF eram os típicos brinquedo que depois que você cresce é que pára para perguntar qual era a graça. Como é que isso virou uma febre? Imagino que quanto mais rico de possibilidades for o brinquedo, no sentido de incetivo à imaginação fértil, mais louco ele será para as crianças. Vai ver que por isso lhes deram os nomes de "Maluca" e "Fluf". A mola, colorida ou multicolorida, podia ser pulseira, colar, cobra; ser movimentada de lá para cá, entre uma mão e outra; ser impulsionada na medida exata para rolar escada abaixo sem parar, o que já abria margem para uma corrida de molas; podia ser unida à outra formando um entrelaçado interessante para a visão; podia ser um campo de força, um túnel psicodélico, enquanto o Fluf, com um nome desses, ou seria algo muito fofo ou algo muito perigoso, tipo um ouriço extra-terrestre...

Ainda falta muito nessa história, mas uma coisa o xerife Woody estava certo: a razão do brinquedo está além de servir para brincar. É ser (ou ter sido) o brinquedo de alguém muito especial. Por enquanto, só resta perguntar: Onde estarão os meus brinquedos? Aqueles que resistiram ao tempo, porque duraram muito, mas que não resistiram ao meu tempo, porque este passou.
A garotinha, porém, tentou lhes dar um fim glorioso. Um recomeço com outras crianças.

segunda-feira, julho 5

"Uma maçã não é nada"?

O mais difícil é começar. É o que muita gente diz.
De fato, experimentamos isso o tempo inteiro. Começar um regime, academia, a ler aquele livro, a fazer aquele trabalho da pós, a arrumar o quarto, a postar no seu blog e por aí vai uma lista quase infinita. Mas de uma maneira muito impressionante, podemos começar quando menos imaginamos.

Durante uma aula, o professor falava sobre a importâcia de, em psicoterapia, trabalharmos com a imagem que o outro ali na nossa frente trás através de um sonho ou de outro discurso, sendo que isso só faz sentido se criarmos uma história em torno da imagem, de modo a se aproximar da história do sujeito. Terminou de explicar e minha amiga entra na sala comendo uma maçã, quando retoma o professor: "O que é uma maçã?".

Um pergunta como essa pode ser respondida de inúmeras maneiras, se for feita a uma criança de 4 anos, um jovem de 14, um pobre na rua, um cego de nascença, psicólogos, arte-terapeutas e astrólogos, sendo os três último o público em questão: "é uma fruta", "alimento", "fruto proibido", "pecado", e começou a viagem... Então disse o professor, com a cara mais blazé do mundo: "Uma maçã não é nada! Mas experimentem criar uma história sobre essa maçã para verem quanta coisa pode surgir. Em três minutos escrevam dois parágrafos contando uma história sobre a maçã, contendo início, enredo, cenário, peripécias e um desfecho".

Nunca pensei que o resultado seria esse...
Um belo dia, uma Grande Maçã decidiu que, antes de morrer, queria deixar no mundo uma floresta de pomares. Como as frutas têm vida curta, tinha que pensar em como realizar isso, ja que só tinha um dia até começar a apodrecer. De repente, vários pássarios e insetos de todas as famílias apareceram para ajudá-la nessa tarefa. Numa espécie de assembléia em torno da Grande Maçã, alguns surgeriram de levar suas sementes e jogar no mar, pois, em meio a tanta água, certamente nasceriam muitos pomares. A senhora não gostou da ideia, mas continuou a ouvir. Outros, então, disseram para que esperasse a morte na lama, pois, de seus resíduos outro pomar poderia nascer em terra fértil. Mas isso  - pensou a fruta gingante - não realizaria seu propósito de deixar toda uma floresta para as futuras gerações. Até que teve a ideia de esperar e ver se a Natureza lhe traria um bom destino.
Ao entardecer, já com algumas manchas que marcavam o início do seu fim, um garotinho faminto passou por ali e viu aquela Grande Maçã. Tudo que precisava para matar que o estava matando! Comeu a maçã com todo gosto e alegria de sentir toda a sua suculência, o estômago oco a ser preenchido rapidamente, o aroma da fruta a fazê-lo salivar. Comeu até o talo, sobrando apenas as sementes. E de tão agradecido à Natureza por ter sido salvo da Fome feroz, decidiu mostrar sua gratidão plantando aquelas sementes, que eram também enormes como a antiga maçã.
Assim o fez, no meio de sua comunidade, uma vila tomanda pela Pobreza, pessoas sedentas e clima cinzento. Plantou as sementes naquela mesma noite que marcou a morte da Grande Maçã. Mas qual não foi sua surpresa no dia seguinte, e de todos os moradores da vila, quando acordaram e viram no meio do vilarejo uma macieira gigante, de copa larga, frondosa, com seu perfume característico e carregadinha de maçãs, ao mesmo tempo em que estava cercada por aquelas mais descuidadas que haviam caído dos galhos (e desde as tribos mais antigas, já se sabe que aquelas que caem são suficientes para a sobrevivência). Estas pequenas foram alvo de todos da vila, de velhos a crianças, felizes pela alegria única de se nutrirem depois de tempos de penúria. Na vida, a morte de uns é o começo para outros...
A alegria tomou conta de todos e uma profunda gratidão e sentimento de solidariedade levou cada morador a plantar as sementes das frutas comidas por onde quer que passassem.
Algumas décadas depois, um satélite ultra potente transmitia imagens de uma enorme floresta intercontinental, toda feita de macieiras. De uma ponta do mundo a outra, as árvores se distribuiam, adaptando-se a todos os tipos de terreno, clima, e sempre dando muitos frutos. Um fenômeno intrigantes, ao mesmo tempo assustador e maravilhoso para muitos que ouviram falar a respeito.
Há quem diga que um pesquisador intrigado, observando as imagens do satélite, chegou a visualizar que as árvores se espalhavam pela Terra formando um Grande Coração.
Enfim, a Grande Maçã morreu feliz.